Pobres amigos de quatro patas. Basta a mulher descobrir que está
grávida para olhar com desconfiança para os animais. "Será que eles
podem fazer mal para o meu bebê enquanto ele ainda está na barriga?",
pergunta-se a futura mãe. A preocupação tem lógica. Algumas doenças
especialmente graves na gestação podem ser transmitidas, principalmente,
pelas fezes dos animais. Mas o risco não é tão grande quanto se pinta.
Tomados os devidos cuidados, os animais podem ser bons companheiros
durante os nove meses.
A situação é, geralmente, estressante para a futura mãe. Mas, na
realidade, pode ser o prenúncio de muita diversão e felicidade para
toda a família. Basta administrá-la com lógica, sem preconceitos, e
adotar atitudes baseadas não no ponto de vista humano, mas sim no ponto
de vista do cão.
Induza o cão a cheirar sua barriga: os ouvidos sensíveis dele perceberão que algo está vivo dentro de você
Ao se tornar grávida, não ceda às primeiras sugestões de doar o seu cão.
Muito menos o isole. Dirão que cachorro e bebê não dão certo, que é
perigoso, que o cão transmite doenças. Quanta falta de informação! Quem
chega da rua e não lava as mãos e o rosto é um vetor (condutor) de
infecções e moléstias pior que qualquer animal doméstico.
Nos períodos pré-natal, neonatal e pós-natal, que são distintos para o
cão, não mude a rotina dele. (lembre-se: ele era o “bebê” da casa
quando chegou – era ou não era?).
Faça a chegada do novo membro da família e a presença dele serem
vantajosas para o cão e o interesse dele. Para tanto, é importante
sempre “raciocinar” como cão. Ele é sensível, seja filhote, seja adulto
ou velhinho. Dependendo da idade dele, aja de forma ligeiramente
diferente. Permito-me a construir um “teatrinho”, que chamarei de “Os
três monólogos de cães”. Um filhote diria, entre pulinhos
(principalmente nas pernas da dona): “Oba! Vou ter companhia pra
brincar. Isso aí é coisa boa! Vim dar uma cheiradinha na roupa dele e
já ganhei um biscoito extra”. O adulto “diria”: Bem… Temos movimento
diferente aqui. Mas pelo jeito dos meus donos, deve ser coisa boa. Vamos
esperar e ver o que é”. E o velhinho, num “resmungo”, meio incomodado
(próprio de velhinhos…): “Sei lá o que “ta” acontecendo. Se vier mexer
comigo dou uns resmungos, uns rosnados… Acho que até uns latidinhos e
mordidinhas… Mas, não, não acho que meus donos me conhecem bem… Ninguém
vai se meter muito comigo”.
Quando conseguimos entender essas atitudes, entendemos o cão dentro
das “regras” dele. Um pouco como os humanos: “Se me tratarem bem, tudo
ok…”. Regra de jogo do behaviorismo mais simples.
Não esconda o bebê: controle o contato entre os dois.
É muito importante que o cão seja levado para uma verificação do estado
geral de saúde dele. As poucas afecções que seriam transmissíveis são
facilmente percebidas pelo veterinário e tratáveis, deixando o cão em
perfeitas condições de convívio com os da casa e, em especial, com o
bebê, cuja imunidade neonatal é incipiente.
Quanto à obediência, a quem o cão “ouve” melhor? Se não for a um dos
donos, um adestrador que conheça condicionamento operante e que saiba
usar o “clicker” poderá ajudar o cão a reconhecer quem são os “alfas” da
casa.
Não se iluda. Seu cachorro sabe muito bem, intuitivamente, que tem
gente nova chegando. Ele deve ser familiarizado com os novos sons,
odores, e visões que terá com a vinda do bebê, nas semanas que antecedem
a chegada. Isso inclui tudo que estará associado ao mais novo
integrante da família: mobiliário, ambientes, roupas, loções e cremes.
O espaço “quarto de bebê” deve ser aberto ao cão, com supervisão e
regras relativas a quando ele pode entrar. Não é aconselhável que o
quarto se torne uma área proibida. Aos que alegarem alergias, diga que
estudos internacionais já mostraram que, quanto mais cedo for o contato
da criança com animais, menor a probabilidade de ela desenvolver
problemas respiratórios. A menos que o bebê nasça alérgico e seja
diagnosticado como tal.
É bom fingir trocar fraldas numa boneca na presença do seu cão, para
ele se acostumar. Isso é importante. Dependendo do apego que o cão vier a
desenvolver com o bebê, vai “defendê-lo” de qualquer perigo, pois a
natureza ensinou a ele que o bebê “filhote” humano é a parte mais fraca
do conjunto.
Induza seu cão a cheirar as futuras roupinhas do bebê. Se ele não se
encostar nelas, prêmio para ele e palavras de carinho e aprovação.
Leve o cão a casas que tenham bebês, para que ele sinta o cheiro de
crianças, aquele odor especial de bebê. Ele também se familiarizará com
diferentes choros – de fome, de dor de barriga, de sono e até,
simplesmente de manha.
Peça roupinhas dos filhos dos seus amigos antes de serem lavadas,
para o cão cheirar. Isso inclui a roupinha de cama. O suor de um bebê
recém-nascido tem odor característico. Lembre-se que os cães são
farejadores naturais e que, quando procuram identificar logo pelo
cheiro, são capazes de distinguir centenas de nuances, enquanto os
humanos detectariam umas quatro ou cinco.
Educar os dois: o cão pode ser à prova de crianças e a criança para ser à prova de cães.
Faça também o seu bebê, enquanto estiver ainda sendo gestado, ouvir os
latidos do cão. Quando ele latir como normalmente faz, fique perto dele.
Se os latidos forem exagerados, fora dos padrões usuais, diga-lhe um
“não” firme, mas sem gritar, para não assustar o bebê.
Sempre que tiver um tempinho, chame o cão, sente num sofá, acaricie-o
e induza-o a cheirar sua barriga. Os ouvidos exatamente sensíveis dele
vão perceber, que dentro de você, algo está vivo.
Faça um grande esforço para não mudar a rotina do cão. Se agora não
dá para continuar a levar o cachorro para passear, consiga outra pessoa
para levá-lo, mas não deixe que ele pare de andar. Peça a amigos que
venham visitá-lo, para que ele se sinta, ainda, o centro de atenção. Não
esqueça de acariciar o cão sempre que possível. Reafirme que você gosta
dele.
Um destaque especial: as fraldas sujas! Filhotes e cães adultos
consideram as fezes de recém-nascido o caviar canino. Se encontrarem
“caviar” disponível, eles o comem. A isso se chama coprofagia, que pode
se tornar crônica. Seu cão não deve chegar muito perto das fraldas, mas
deve saber o que é feito com elas. Guarde-as em recipiente de lixo à
prova de cão “investigativo”, principalmente se o cão for filhote. Um
bebê com diarréia provocada por salmonela, por exemplo (um dos poucos
males vindos de humanos que podem afetar os cães), ainda que pouco
provável, pode contaminar o cão, seja filhote ou adulto.
Não esconda o bebê do cão. Controle o contato entre eles. Nunca deixe
uma criança sozinha com o mais manso dos cães, até ela ter pelo menos
oito anos. O cão é irracional. Não tem noção de ética, não sabe
diferenciar o bem do mal, e sim o perigoso do seguro. Não ser racional
não significa não ter “sentimentos”. Ele é leal. Ama você e sua família
(a “matilha” dele) incondicionalmente. Pode ser capaz dos maiores atos
de verdadeiro heroísmo, praticados na defesa de seus donos. Mas, em
determinadas circunstâncias, geralmente por medo, por dor ou por
sentir-se acuado, o cão morde o próprio dono ou quem que quer esteja
representando perigo ou dor. Se o cão não for educado e se tiver
tendência possessiva, pode atacar quem se aproximar da comida dele, por
exemplo. Há exercícios próprios para educá-lo nesse particular. Preste
bem atenção nisso, pois quando menos você esperar, seu filho estará
comendo a ração do cão e esse último, o biscoito do intrépido infante. É
possível educar um cão para ser a prova de crianças e a criança para
ser a prova de cães.
Fonte: Revista Cão & Cia